sexta-feira, 8 de abril de 2016

Por que ficar nu em uma praia de nudismo não é ato obsceno?

Você já se perguntou por que a polícia prende e a justiça condena pessoas que andam nuas pela rua mas não prende ou condena pessoas nuas em praia de nudismo?



A razão é simples: moralidade. Recentemente falamos de moralidade quando falamos de sacrificar animais. O mesmo princípio moralidade pública impera quando falamos de nudez pública.

Quando alguém é preso e condenado por estar nu, a condenação é quase sempre baseada em um dos artigos mais subjetivos de nosso Código Penal: o ato obsceno. O artigo 233 de nosso Código Penal diz que o crime de ato obsceno consiste em “praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público”. Mas reparem que ele não define o que é um ato obsceno. O que ele diz é a mesma coisa de dizer definir um elefante como ‘sendo um animal idêntico a um elefante’. É o que os filósofos, matemáticos e linguistas chamam de definição circular.

Pois bem, a lei deixa a cargo do magistrado definir o que é um ato obsceno. E isso vai variar de acordo com o tempo e lugar. Houve um tempo em que uma mulher expor sua canela era considerado obsceno. E há países em que mulheres exporem seus rostos, ainda hoje, é considerado obsceno.

Como a lei não diz o que é ato obsceno, o magistrado tem a flexibilidade de definir o que deve ser considerado obsceno de acordo com os costumes e tempo em que aquele ato aconteceu. Hoje, por exemplo, nenhuma mulher no Brasil seria condenada por expor suas pernas em público.

Mas esse é também o problema da lei. Como ela deixa a cargo do magistrado definir o que é obsceno, ninguém tem muita certeza do que isso significa hoje em dia. É fácil identificar os extremos (por exemplo, é difícil achar alguém que não chamaria de obsceno um casal resolver fazer sexo no meio da Avenida Paulista durante o dia), mas é difícil decidir o que não é extremo. Um beijo mais quente é obsceno? Isso vai variar de pessoa para pessoa, e de magistrado para magistrado.

OK, então sabemos que andar nu na Paulista é ato obsceno. E andar nu na praia de Copacabana? Bem, provavelmente obsceno. Tanto é assim que as pessoas na praia de Copacabana não estão nuas. Então qual é a diferença entre a praia de Copacabana e a Praia de Abricó, também na cidade do Rio de Janeiro?

A diferença – e é muito sútil – é que a resolução 64/94 da Câmara Municipal do Rio diz que aquela é uma praia de naturismo. Ou seja, ela diz que quem for a aquela praia deve esperar encontrar pessoas nuas. Ora, se você espera encontrar pessoas nuas em um determinado local, não há como o estado dizer que tal nudez é obscena. Por mais surpreendente que pareça, essa é a mesma lógica que impede que os foliões semi-nus (e às vezes totalmente nus) sejam presos durante o carnaval ou que alguém nu em um vestiário seja preso: nesses locais e momentos é de se esperar que as pessoas estejam nuas ou semi-nuas. Logo, não é possível dizer que é obsceno o que elas estão fazendo.


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